Diálogo com um jovem da geração à rasca...
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04-04-2011, 23:08
Mensagem: #1
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Diálogo com um jovem da geração à rasca...
Diálogo com um jovem à rasca
- Então, foste à manifestação da geração à rasca? - Sim, claro. - Quais foram os teus motivos? - Acabei o curso e não arranjo emprego. - E tens respondido a anúncios? - Na realidade, não. Até porque de verão dá jeito: um gajo vai à praia, às esplanadas, as miúdas são giras e usam pouca roupa. Mas de inverno é uma chatice. Vê lá que ainda me sobra dinheiro da mesada que os meus pais me dão. Estou aborrecido. - Bom, mas então porque não respondes a anúncios de emprego? - Err... - Certo. Mudando a agulha: felizmente não houve incidentes. - É verdade, mas houve chatices. - Então? - Quando cheguei ao viaduto Duarte Pacheco já havia fila. - Seguramente gente que ia para as Amoreiras. - Nada disso. Jovens à rasca como eu. E gente menos jovem. Mas todos à rasca. - Hum... E estacionaste onde? No parque Eduardo VII? - Tás doido?! Um Audi TT cabrio dá muito nas vistas e aquela zona é manhosa. Não, tentei arranjar lugar no parque do Marquês. Mas estava cheio. - Cheio de...? - De carros de jovens à rasca como eu, claro. Que pergunta! - E...? - Estacionei no parque do El Corte Inglés. Pensei que se me despachasse cedo podia ir comprar umas coisinhas à loja gourmet. - E apanhaste o metro. - Nada disso. Estava em cima da hora e eu gosto de ser pontual. Apanhei um táxi. Não sem alguma dificuldade, porque havia mais jovens à rasca atrasados. - Ok. E chegaste à manif. - Sim, e nem vais acreditar. - Diz. - Entrevistaram-me em directo para a televisão. - Muito bom. O que disseste? - Que era licenciado e estava no desemprego. Que estava farto de pagar para as reformas dos outros. - Mas, se nunca trabalhaste, também não descontaste para a segurança social. - Não? Pois... não sei. - Deixa-me adivinhar: és licenciado em Estudos Marcianos. - F***-se! És bruxo, tu? - Palpite. E então, gritaste muito? - Nada. Estive o tempo todo ao telemóvel com um amigo que estava na manif do Porto. E enquanto isso ia enviado mensagens para o Facebook e o Twitter pelo iPhone e o Blackberry. - Mas isso não são aparelhinhos caros para quem está à rasca? - São as armas da luta. A idade da pedra já lá vai. - Bem visto. - Quiriquiri-quiriquiri-qui! Quiriquiri-quiriquiri-qui! - Calma, rapaz. Portanto despachaste-te cedo e ainda foste à loja gourmet. - Uma m*rda! A luta é alegria, de forma que continuámos a lutar Chiado acima, direitos ao Bairro Alto. Felizmente uma amiga, que é muito previdente, tinha reservado mesa. - Agora os tascos do Bairro aceitam reservas? - Chamas tasco ao Pap'Açorda? - Errr... E comeram bem? - Sim, sim. A luta é cansativa, requer energia. Mas o pior foi o vinho. Aquele cabernet sauvignon escorregava... - Não me digas que foste conduzir nesse estado. - Não. Ainda era cedo. Nunca ouviste dizer que a luta continua? E continuou em direcção ao Lux. Fomos de táxi. Quatro em cada um, porque é preciso poupar guito para o verão. Ah... a praia, as esplanadas, as miúdas giras e com pouca roupa... - Já não vou ao Lux há algum tempo, mas com a crise deve estar meio morto, não? - Qual quê! Estava à pinha. Muita malta à rasca. - E daí foste para casa. - Não. Apanhei um táxi para um hotel. Quatro estrelas, que a vida não está para luxos. - Bom, és um jovem consciente. Como tinhas bebido e... - Hã?! Tu passas-te! A verdade é que conheci uma camarada de luta e... bem... sabes como é. - Resolveram fazer um plenário? - Quê? Às vezes não te percebo. - Costuma acontecer. E ficaram de ver-se? - Ha! Ha! Ha! De ver-se, diz ele. Não estás a ver a cena. De manhã chegámos à conclusão que ela era bloquista e eu voto no Portas. Saiu porta fora. Acho que foi tomar o pequeno-almoço à Versailles. - Tu tomaste o teu no hotel. - Sim, mas mandei vir o room service, porque ainda estava meio ressacado. - Depois pagaste e... - A crédito, atenção. Com o cartão gold do Barclays. - ... rumaste a casa. - Sim, àquela hora a A5 não tinha trânsito. Já não havia malta à rasca a entupir o tráfego. - Moras onde? Paço d'Arcos? Parede? - Que horror! Não, não. Moro na Quinta da Marinha, numa casita modesta que os meus pais se vêem à rasca para pagar. Para a próxima levo-os comigo. |
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